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A crise da geração de aconselhamento e laudos por LLMs e a inércia dos conselhos profissionais

LLMs geram laudos sem responsabilidade técnica legal. Confea, CAU e CFT permanecem omissos diante do risco de exercício ilegal da profissão.
O uso de IA para laudos técnicos ameaça a responsabilidade profissional (Atualidade Política / Divulgação)

O perigo oculto na geração de laudos técnicos de engenharia e a lenta resposta dos Conselhos Profissionais à revolução da IA

A recente reestruturação das políticas de uso de plataformas de Inteligência Artificial, como a anunciada pela OpenAI (que unifica e reitera a proibição de aconselhamento personalizado sem licença profissional), acendeu um alerta fundamental no Brasil: o crescente risco da utilização de Large Language Models (LLMs) para o fornecimento de orientação e, mais grave, para a geração de documentos que exigem Responsabilidade Técnica (RT). A linha divisória entre a ferramenta de apoio e o exercício ilegal da profissão está sendo borrada, expondo a sociedade a riscos técnicos e legais sem precedentes.

O debate vai muito além do aconselhamento genérico. O verdadeiro ponto de inflexão reside na capacidade de LLMs serem empregadas, mesmo que de forma auxiliar, na elaboração de laudos técnicos, projetos e pareceres em áreas críticas como Engenharia, Arquitetura e as diversas modalidades Técnicas Industriais e Agrícolas.

Nestas profissões, a legislação brasileira exige a emissão de documentos obrigatórios – como a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) no Sistema Confea/Crea, o Registro de Responsabilidade Técnica (RRT) no CAU, ou o Termo de Responsabilidade Técnica (TRT) no Sistema CFT/CRTs. Tais documentos são o pilar da segurança jurídica e da proteção social, atestando que o serviço foi executado por um profissional legalmente habilitado, com registro ativo e que se responsabiliza integralmente pelas consequências de seu trabalho, inclusive civil e criminalmente.

Uma LLM, por mais avançada que seja, é uma ferramenta algorítmica; ela não possui registro profissional, não está sujeita a código de ética e, crucialmente, não pode assinar um documento de RT. O uso de textos ou dados gerados por IA como base ou mesmo como produto final de um laudo representa uma fraude potencial, onde a responsabilidade técnica é simulada, mas a garantia profissional é inexistente.

A omisssão questionável dos conselhos profissionais

Diante de um avanço tecnológico que reconfigura o próprio exercício profissional, a postura dos principais órgãos de fiscalização no Brasil – o Sistema CFT/CRTs, o CONFEA/CREAs e o CAU – tem sido notavelmente discreta, quando não omissa, no tocante à regulação e fiscalização do uso de LLMs.

Embora notícias mostrem que os Conselhos têm debatido internamente a harmonização de suas atividades, a obrigatoriedade da RT e a modernização de seus próprios sistemas (inclusive com a implementação de soluções tecnológicas para registro e fiscalização até o final de 2025, conforme o Plano de Metas do Confea), falta um posicionamento público e normativo enfático sobre a fronteira entre a assistência da IA e o exercício privativo da profissão.

A sociedade, os próprios profissionais e, principalmente, as empresas que buscam eficiência, precisam de diretrizes claras. Os Conselhos têm o dever legal de:

  • Regulamentar o uso de IA: Estabelecer limites éticos e técnicos para a incorporação de LLMs nos processos de projeto e laudo, sem tolher a inovação.
  • Fiscalizar ativamente: Desenvolver mecanismos para identificar e punir o uso de laudos "frios" ou gerados por IA sem a devida, integral e autêntica responsabilidade técnica de um profissional habilitado.
  • Alertar a sociedade: Realizar campanhas sobre os riscos de buscar "aconselhamento profissional" ou "laudos" em plataformas não regulamentadas.

Se os Conselhos se limitarem a discutir a ART, RRT e TRT apenas em seu formato tradicional, ignorando o vetor transformador da IA, correm o risco de se tornarem irrelevantes na garantia da qualidade e segurança técnica. A hesitação na regulamentação pode ser interpretada como uma omissão perigosa, abrindo uma brecha para o exercício ilegal e a desvalorização das profissões regulamentadas.

É urgente que o Sistema CFT/CRTs, CONFEA/CREAs e CAU assumam a vanguarda desta discussão, assegurando que, na era da inteligência artificial, a responsabilidade e a ética profissional permaneçam insubstituíveis e devidamente fiscalizadas. A segurança da sociedade depende da capacidade humana de assumir a autoria e as consequências do conhecimento técnico.

Emerson Tormann

Técnico Industrial em Elétrica e Eletrônica, especializado em Tecnologia da Informação e Comunicação. Atualmente, é Editor-Chefe na Atualidade Política Comunicação e Marketing Digital Ltda. Possui ampla experiência como jornalista e diagramador, com registro profissional DRT 10580/DF. https://etormann.tk | https://atualidadepolitica.com.br

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