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| Imagem gerada por IA / Nano Banana |
Governo barra subsídios para conter tarifa, enquanto especialista aponta "colcha de retalhos" regulatória e desafios para a indústria
O novo marco, publicado no último dia 25 de novembro, tenta equilibrar a modernização do setor com a contenção de custos, impondo mais de dez vetos a dispositivos que poderiam onerar ainda mais a conta de luz.
A nova legislação reorganiza eixos fundamentais como a abertura do mercado livre, o armazenamento de energia e a segurança do sistema. No entanto, para Frederico Boschin, advogado especialista em regulação e convidado do podcast Energia 360, embora a lei traga avanços tecnológicos necessários, a forma como foi conduzida – via Medida Provisória e sem amplo debate prévio – resultou em uma "colcha de retalhos" que ataca sintomas, mas não as causas estruturais das distorções do setor elétrico brasileiro.
Vetos no Curtailment: "Risco é do gerador"
Um dos pontos mais sensíveis da sanção foi o veto ao ressarcimento amplo por curtailment (cortes de geração) motivado por falta de demanda. Pelo texto sancionado, o ressarcimento via encargos fica restrito a cortes por indisponibilidade externa ou confiabilidade elétrica, descartando a compensação financeira quando o corte ocorre simplesmente porque "não há quem consuma".
Segundo Boschin, essa decisão do governo é coerente com a lógica de mercado. "Isso se associa muito ao conceito de produtor independente de energia: a geração é por conta e risco do gerador. Se não existe consumo, é risco do gerador, e ele não seria indenizado", explica o especialista.
Essa medida evita que o consumidor, já pressionado por encargos setoriais elevados, pague por uma energia que não foi utilizada. Para Boschin, o sinal que o veto envia é claro: "O Brasil precisa aumentar o seu consumo de energia para evitar o curtailment. Hoje, geramos muita energia renovável, mas não conseguimos consumir porque ela chega muito cara à ponta final, principalmente para a indústria".
Segurança Energética: O retorno do "Patinho Feio"
A Lei 15.269 também pragmatiza a transição energética ao manter a contratação de térmicas a carvão e incentivar Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), medidas criticadas por alas ambientalistas, mas defendidas sob a ótica da segurança operacional.
"Os países não geram energia como querem, e sim como conseguem", argumenta Boschin, destacando que a expansão massiva de fontes intermitentes (solar e eólica) retirou flexibilidade do sistema. Nesse contexto, as PCHs despontam como as "grandes vencedoras" do novo marco.
Antes vistas como o "patinho feio" devido a entraves ambientais, as PCHs são revalorizadas pela capacidade de oferecer serviços ancilares e reservatórios distribuídos. "Não dá para atacar todas as fontes e esperar que geraremos energia limpa eternamente sem segurança", pontua o advogado, reforçando que essa fonte é um ativo estratégico para a estabilidade da rede.
Abertura do Mercado e Baterias: A corrida do ouro
Olhando para o futuro, a lei estipula um cronograma para a abertura total do mercado livre na baixa tensão, prevista para alcançar consumidores residenciais a partir de 2029. Boschin classifica esse movimento como uma "corrida do ouro" pela captura de consumidores e uma oportunidade de modernização tarifária, onde a separação entre o custo do fio e o da energia ficará mais clara.
Outro avanço é a regulação do armazenamento de energia (baterias e usinas reversíveis). Contudo, vetos importantes retiraram a possibilidade de repassar custos de baterias diretamente aos consumidores, concentrando o ônus nos geradores. Embora proteja a tarifa no curto prazo, Boschin alerta que isso pode afastar investimentos em uma tecnologia vital para corrigir a intermitência da energia solar, que hoje domina a expansão da matriz.
Impacto na Indústria e Competitividade
A sanção da lei ocorre em um momento delicado para o setor produtivo. Com a indústria operando com margens apertadas e a previsão de tarifas subindo acima da inflação em 2025, a modicidade tarifária buscada pelos vetos é um alívio parcial, mas não definitivo.
A análise de Boschin sugere que o problema central do Brasil deixou de ser a falta de energia e passou a ser a incapacidade de consumi-la devido ao preço. "Estamos jogando energia fora porque não temos consumo... ou a gente aumenta a atividade econômica ou reduz a tarifa", alerta.
Para a indústria, a nova lei traz a promessa de maior competitividade futura com o mercado livre e a figura do Supridor de Última Instância (SUI), mas mantém o desafio imediato de lidar com os encargos da CDE (Conta de Desenvolvimento Energético), que agora ganha novas regras de teto orçamentário para tentar estancar a sangria de subsídios.
O Caminho à Frente
Com a lei em vigor, a bola passa para a Aneel e a CCEE regulamentarem os detalhes técnicos. Apesar das críticas sobre a falta de planejamento estrutural, Boschin mantém um otimismo cauteloso sobre as oportunidades de negócios, especialmente em digitalização, smart grids e novos modelos tarifários que a lei fomenta.
"É uma reorganização dos interesses dentro do setor", conclui o especialista, indicando que, embora nascida de uma "colcha de retalhos", a Lei 15.269 ditará as regras do jogo para a próxima década de transição energética no Brasil.
Assista à entrevista no canal OSetorElétrico do YouTube


