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A força energética que vem do Sol

INFRAESTRUTURA

Estudo aponta que a captação de energia solar em apenas 0,41% do território do Distrito Federal seria suficiente para abastecer toda a população. Estudantes da UnB, em parceria com a WWF, mapearam os telhados da capital que poderiam receber as placas fotovoltaicas

» Veja o estudo

Brasília é uma cidade conhecida mundialmente por ser de vanguarda. Dos prédios monumentais às tesourinhas como opção de retorno, a capital do Brasil nasceu com a missão de sempre estar à frente. Por isso, é o momento de trazer para si conceitos atuais das mais modernas metrópoles mundiais. Entre eles, o de envolver o cidadão em questões antes controladas apenas pelo Estado, como a produção de energia elétrica. Uma das principais potencialidades da cidade é a energia solar. Usando apenas 0,41% da área correspondente ao território do Distrito Federal, seria possível gerar energia elétrica para toda a demanda da população. Para a instalação dos equipamentos, não são necessários novos espaços, apenas uso dos telhados existentes.

Por causa da boa irradiação solar, é necessário à instalação de painéis de captação em uma área correspondente a 24km² — metade de uma região administrativa como o Guará. Se o DF tivesse a quantidade suficiente de placas, seria possível diminuir a dependência da energia vinda de hidrelétricas. As informações são do estudo Potencial da Energia Solar Fotovoltaica de Brasília, desenvolvido pela organização não governamental WWF-Brasil, em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), e obtido com exclusividade pelo Correio.

Pesquisas mostram que o Brasil é um dos países que mais têm potencial de geração de energia elétrica via solar. Para se ter uma ideia, o pior cenário brasileiro de irradiação solar é superior aos melhores índices da Alemanha, país referência na produção de energia elétrica por painéis fotovoltaicos. A média anual de geração por painel instalado no Brasil varia de 4,25 a 6,25kWh/m².

Mesmo assim, a produção brasileira é baixíssima. Segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), são 5.437 projetos de energia solar no Brasil — a agência tem uma ambiciosa projeção de 1,14 milhão até 2024. “A energia solar é uma opção viável e real. Há seis anos, a eólica não era nada, hoje, é 6% da matriz energética brasileira. O solar ainda é menos de 1% e a tendência é crescer. Os dados de irradiação são bons e há muitos telhados disponíveis no país”, justifica Hugo Lamin, assessor da Superintendência de Regulação dos Serviços de Distribuição da Aneel.

O Distrito Federal segue a tendência brasileira de bom desempenho de produção da energia solar. Na capital da República, a média anual é de 5,8kWh/m², segundo dados da WWF e da UnB. A arquitetura também ajuda na produção solar de energia: o tombamento volumétrico da cidade permite que haja pouco sombreamento entre os prédios e casas, o que potencializa as áreas utilizáveis do telhado — a média é de 30% a 50%. As temperaturas máximas, em até 34ºC, também contribuem para que os equipamentos tenham melhor eficiência e durabilidade.

Além disso, a capital conta com uma alta renda per capita, o que permite o alto investimento — ainda um dos principais entraves para o pleno desenvolvimento da energia solar no país. “Brasília tem condições perfeitas: insolação alta, pouco sombreamento, nível alto das classes econômicas que poderiam investir nisso, todas as características para o DF ser referência como cidade solar”, explica André Nahur, coordenador do Programa Mudanças Climáticas e Energia do WWF-Brasil.


Potencial
O professor de engenharia elétrica da UnB Rafael Shayani organizou o grupo de 16 alunos que fez o mapeamento dos telhados das asas Sul e Norte, dos lagos Sul e Norte, do Park Way, do Sudoeste e do Cruzeiro. Eles usaram o Google Earth e visitaram as regiões para analisar a potencialidade dos telhados. O levantamento mostrou que é possível aproveitar a área entre 30% e 50%, uma vez que, no telhado, também tem caixa d’água, antenas. A partir dos estudos dessas regiões, foi possível fazer as projeções para todo o DF.

Como o território é pequeno e muito urbanizado, as micro e minigerações ganham mais fôlego do que em outras unidades da Federação. “Brasília é o símbolo do modernismo. Uma vantagem da energia solar é que elas podem ser espalhadas nos telhados, não vão ocupar área útil. Os painéis tendem a se integrar com a edificação”, analisa. Segundo o estudo, o telhado de uma casa no padrão dos Lagos e do Park Way pode gerar energia para ele e mais 10 residências. “Seria uma solução para a crise energética”, complementa Shayani.

Embora tenha potencial, o Distrito Federal ainda é a 11ª unidade da Federação em quantidade de projetos instalados. Segundo dados da Aneel, são apenas 119 em todo o território candango. A Companhia Energética de Brasília (CEB) informou que 191 projetos foram apresentados desde 2012. Ainda existem alguns a serem analisados pela companhia. Minas Gerais é o estado com mais projetos de microgeração solar do país. “A CEB percebe um aumento significativo do número de projetos e vê com bons olhos”, diz Marcelo Meloni, superintendente de faturamento e garantia de receita da companhia.

Tanto no Brasil, quanto no DF, a maioria dos projetos de microgeração são residenciais. O empresário Gilberto Azevedo, 61 anos, instalou 42 painéis em sua casa no Lago Norte há um ano. Para isso, investiu R$ 68 mil. Ele conta que, desde então, as faturas baixaram de uma média de R$ 1 mil para R$ 50. “Eu tinha visto o modelo na Alemanha e me interessei bastante. Quando cheguei ao Brasil, comecei a pesquisar e instalei aqui em casa”, comenta. “Para mim, a energia limpa e solar não é o futuro, é o agora. E precisa de incentivos para crescer no país”, complementa.

"Para mim, a energia limpa e solar não é o futuro, é o agora. E precisa de incentivos para crescer no país”  Gilberto Azevedo, empresário

O que diz a lei
A primeira regulamentação sobre microgeração de energia elétrica no Brasil é de 2012. Até então, cabia às concessionárias aceitar ou não essa possibilidade, assim como criar as regras específicas. A última atualização normativa feita pela Aneel é de 2015 e vale desde março deste ano. Entre as novidades, a resolução diminuiu os prazos entre a apresentação do projeto e a autorização na concessionária, permitiu a possibilidade de compartilhar a energia produzida e aumentou o prazo para uso dos créditos de energia excedente.

Programe-se
O lançamento do estudo Potencial Solar Fotovoltaico de Brasília será no próximo dia 25, no Hotel Manhattan, das 9h às 12h. O projeto é uma parceria da WWF, UnB e Secretaria do Meio Ambiente.


Alternativa às hidrelétricas

A opção pela energia solar é uma tentativa de diversificar a matriz energética brasileira, atualmente concentrada em hidrelétricas. No Distrito Federal, por exemplo, praticamente 100% da energia vêm de duas grandes usinas: Itaipu e Furnas. Assim, as micro e minigerações seriam uma opção para diminuir a dependência da água para a produção da eletricidade, o que poderia impactar na crise hídrica vivida pelo país em localidades como o DF, o Nordeste e São Paulo, uma vez que sobraria maior vazão nos rios e eles poderiam ser usados no abastecimento.
Estudos mostram que até 2040 haverá uma redução de 40% dos mananciais do país por causa do aumento do consumo de água e da diminuição das chuvas. Em compensação, o consumo de água e energia deve dobrar no Brasil. Por isso, é urgente pensar em outras formas de gerar eletricidade. Os sistemas brasileiros estão trabalhando no limite. A analista de conservação do programa de Mudanças Climáticas e Energia da WWF, Alessandra Mathyas, dá como exemplo a usina de Sobradinho, na Bahia. Ela conta que a vazão é de 800m³/s, entretanto, por causa da estiagem, o rio vem recebendo de reposição de água apenas 400m³/s, o que significa que há um deficit. “Por isso, os reservatórios estão abaixando”, explica.

Além da questão hídrica, a microgeração solar é uma opção para a redução da emissão de carbono, uma vez que poderia ser uma alternativa a outras formas de gerar energia, como termelétricas, que usam combustível fóssil — extremamente poluente. “O setor elétrico é muito conservador, ele está acostumado com o modelo: falta água, ligo as térmicas. Esse é um sistema passado, precisamos de energia limpa”, defende Rafael Shayani, professor de engenharia elétrica da UnB. A preocupação dos ambientalistas é com a Medida Provisória 735, aprovada pelo Congresso este ano, que mantém o incentivo às termelétricas, mas não apoia energias limpas, como a solar.

Outra vantagem do sistema solar é a diminuição da perda na transmissão. Como a energia é gerada próximo ao local de consumo, não há perda no transporte. No sistema de grandes hidrelétricas, como Itaipu e Belo Monte, até atingir o consumidor final, a perda chega a 15%, uma vez que as linhas de transmissão são longas. No sistema fotovoltaico, o impacto ambiental são as placas de silício e o lixo eletrônico, mas a durabilidade dos equipamentos é superior a 25 anos e as peças podem ser reaproveitadas.


Facilidades e entraves
Embora o Brasil tenha sol praticamente o ano todo, a energia solar como possibilidade energética é recente no país. As resoluções da Aneel uniformizando o tema têm apenas quatro anos. Somente este ano, passou a valer a possibilidade de compartilhar a energia com as unidades de um condomínio, o prazo de uso do crédito foi alongado de três para cinco anos e a potência gerada permitida aumentou. O período de análise do projeto pela concessionária também diminuiu, assim como veio a obrigatoriedade de discriminar a quantia de energia injetada na rede e o gasto pelo consumidor. “A legislação é boa e vem caminhando. Mas ainda há passos para avançar”, analisa Alessandra Mathyas, da WWF. Para ela, a impossibilidade de o consumidor vender a energia para a concessionária ainda é um empecilho.

Com a melhora na legislação, o foco está no financiamento e na tributação. Ainda há quatro estados brasileiros que cobram imposto de quem gera a energia — Paraná, Acre, Espírito Santo e Roraima. Alguns bancos até têm linha de crédito, mas os juros são altos. Apenas agricultores familiares contam com juros subsidiados para energia solar. E o investimento ainda é alto — em média, de R$ 30 mil a R$ 60 mil em uma residência. As concessionárias também estão se adaptando. A CEB, por exemplo, ainda faz a fatura manualmente porque não conseguiu modernizar o sistema. Por isso, há meses que os consumidores não recebem a conta detalhada como deveria.

Mateus Alves De Sordi é engenheiro eletricista. Ele conta que sentiu aumento na demanda por contratação do serviço em Brasília do ano passado para este. Segundo ele, o incremento não foi maior porque a alta do dólar encareceu os sistemas, uma vez que as placas são importadas. Entretanto, o tempo de retorno do investimento de cinco a oito anos e a falta de linhas de crédito têm atrapalhado o mercado em potencial. “As empresas tentam criar as melhores condições para o cliente, mas, por ser um investimento alto, é preciso um olhar do governo”, acredita. “A microgeração está quebrando um paradigma gigantesco, de o consumidor receber uma conta e pagar. Agora, ele pode tomar decisões”, acredita.

Para a WWF, o tema vem crescendo no Brasil. Antes, as concessionárias de energia elétrica se recusavam a falar sobre isso. Hoje, o discurso é de adaptação das receitas. “A CEB, por exemplo, tem que se adaptar aos novos mercados. Não tem como fugir”, defende Marcelo Meloni, superintendente de Faturamento e Garantia de Receita da CEB.

Informações
Um relógio medidor é instalado com os painéis para a geração de energia elétrica. Ele traz informações como, quanto de energia está sendo produzido no momento e no mês, além do histórico do aparelho. Na fatura da concessionária, deve constar quanto foi gerado de energia, o excedente e o crédito que a microgeração deixa para o proprietário das placas.

Para saber mais

Geração distribuída
O Sistema de Compensação de Energia Elétrica é o processo que permite ao cliente instalar pequenos geradores em sua unidade consumidora e trocar energia com a distribuidora local — no caso do Distrito Federal, a CEB. A regra é válida somente para as unidades consumidoras que utilizem geradores de fontes incentivadas de energia, como hídrica, solar, de biomassa e eólica. No modelo solar, o cliente gera energia por painéis solares fotovoltaicos e a energia é cedida por meio de um empréstimo gratuito à concessionária e, posteriormente compensada, com o consumo da unidade. Quando a geração for maior que o consumo, o saldo positivo de energia poderá ser usado para abater na fatura do mês subsequente ou em outras unidades da escolha do cliente, desde que elas estejam na mesma área de concessão e sejam do mesmo titular. Os créditos de energia ativa gerados e não compensados no consumo de energia elétrica expirarão em 60 meses após a data do faturamento.

Fonte: CB
Emerson Tormann

Técnico Industrial em Elétrica e Eletrônica com especialização em Tecnologia da Informação e Comunicação. Editor chefe na Atualidade Política Comunicação e Marketing Digital Ltda. Jornalista e Diagramador - DRT 10580/DF. Sites: https://etormann.tk e https://atualidadepolitica.com.br

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