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Geração distribuída traz desafios a distribuidoras

Geração distribuída

A rápida expansão e a crescente diversidade da geração distribuída (GD) oferecem novas oportunidades e desafios às distribuidoras de energia elétrica. Portanto, exigirão nova concepção das funções e responsabilidades dessas empresas. Novas tecnologias, além de alterações de sua base institucional e regulatória serão necessárias.

A GD pode permitir o adiamento ou a redução de investimentos nas redes de distribuição, melhorar a qualidade do fornecimento, reduzir perdas de transporte e prover suprimento competitivo com aquele da geração centralizada, em boa parte transmitida através de longas distâncias.

A GD poderá ser destinada à autoprodução ou ser adquirida pela distribuidora local (até 10% dos requisitos de seu mercado cativo, conforme a legislação em vigor). Por outro lado, a maioria da GD carece de capacidade de reserva (backup) própria, ou contratada, tanto para eventuais insuficiências como para manutenção programada. Devido à crescente instalação de GD, utilizada ou disponível intermitentemente (por razões tarifárias ou por provir de fontes renováveis de disponibilidade muito variável) e desprovida de capacidade de regularização, as distribuidoras tornam-se cada vez mais provedoras da reserva de energia e de potência, para assegurar a continuidade do consumo.

As distribuidoras precisarão conviver com demandas de energia e potência mais voláteis do que agora

Atualmente a distribuidora é vista e remunerada apenas como prestadora de "serviço de fio". Portanto, responsável pela operação, expansão e manutenção da rede de fornecimento à sua área de concessão. Mas também lhe cabem funções relevantes como a arrecadação dos recursos destinados à remuneração dos serviços de transmissão e geração, dos impostos e encargos setoriais, e a contratação do suprimento da energia necessária ao atendimento de seus consumidores cativos. Se essa compra for excessiva ou insuficiente, a empresa pode ser penalizada. Portanto, corre risco financeiro, não remunerado, e que tende a ser agravado com o crescente papel de provedor de reserva, altamente variável, que precisa ser contratada junto a geradores e à rede básica de transmissão. Ao mesmo tempo, a distribuidora, caso não considere e gerencie de forma efetiva e criativa a GD, em articulação com seus investimentos, perde parte significativa de sua receita em decorrência da autoprodução.

Estima-se que atualmente sejam gerados no Brasil cerca de 8 GW no horário de ponta, por autoprodutores, a maioria acionada a óleo diesel. Na Alemanha, onde a energia solar gerou 7% dos requisitos de energia elétrica em 2014, alcançando 35% em dias ensolarados, variações de insolação podem exigir grandes contingentes de reserva. Esse país, todavia, tem a vantagem de contar com grande capacidade termelétrica e de estar interconectado com um sistema continental.

A economia das distribuidoras e dos serviços prestados poderá ser bastante afetada: 1- pela variabilidade de algumas GD, o que exigirá capacidade de prover reserva (backup) em quantidades crescentes de potência e energia e 2- pela difusão da GD junto aos consumidores atendidos em baixa tensão, sobretudo se associada ao net-metering ou seja, o escambo de energia entre os consumidores que possuam geração própria e as distribuidoras, o que poderá reduzir a remuneração dos investimentos na rede, devido a tarifa aplicada a esses consumidores ser monômia.

Assim, deverá haver maior necessidade de reserva de capacidade de geração e transmissão, bem como maior incerteza quanto à sua utilização. É provável que à medida que a potência agregada de fontes intermitentes aumente, também seja necessário aumentar a reserva girante. Alternativamente, será necessário compensar a variabilidade da oferta dessas geradoras, armazenando parte da energia disponível de menor custo, para não recorrer à geração termelétrica, cujas emissões poderiam anular o benefício ambiental proporcionado pela GD de fontes renováveis.

Apesar das distribuidoras não poderem ter geração própria, não há legislação referente à possibilidade de utilizarem baterias e outros sistemas de acumulação de energia, capazes de prover o suporte referido. Como todo sistema de acumulação tem perdas, uma bateria ou uma usina hidrelétrica reversível constitui um consumidor líquido, e portanto não deverá sofrer a limitação dos 10% dos requisitos do mercado para aquisição dos seus serviços. Assim, tal como vem ocorrendo em outros países, essas modalidades de geração temporária por acumulação de energia, preferencialmente situadas junto ou próximas às redes de distribuição poderiam ser instaladas e operadas pelas distribuidoras ou por terceiros, sob comando operativo das concessionárias.

Para que se defina mais adequadamente o arcabouço legal e regulatório das distribuidoras, deve-se considerar que as redes de distribuição continuarão a ser indispensáveis, inclusive para os usuários de GD, posto que a confiabilidade do seu suprimento dificilmente será tão elevada quanto a do sistema interligado. Portanto, a remuneração dos investimentos e das despesas de operação e manutenção das distribuidoras, inclusive a daquela para prover reserva, precisa ser assegurada.

Assim, além da remuneração dos seus investimentos, as distribuidoras precisarão conviver com demandas de energia e potência mais voláteis do que agora, o que aumenta o risco de ficarem subcontratadas ou com sobras, sem receita para remunerá-las. E parte dessas incertezas também deverão se refletir nos sistemas de geração e transmissão do SIN. A participação crescente da GD tende a aumentar a necessidade de que o SIN e, em particular, as redes de distribuição, assumam maior papel de prestador de reserva. Conflitos decorrentes da necessidade de recuperar investimentos e de exigências operacionais poderão tornar a gestão do setor elétrico ainda mais complexa.

Por outro lado, as vantagens que a GD oferece a seus usuários e à rede tornam inexorável sua expansão, sobretudo em face da necessidade de aumentar o aproveitamento de fontes de energia renovável. Portanto, a legislação, inicialmente concebida para o sistema elétrico tradicional, de fluxo unidirecional das geradoras para as distribuidoras e destas para os consumidores, precisará 1- refletir a crescente complexidade gerencial do sistema elétrico, com papel mais ativo dos consumidores, 2- permitir que as distribuidoras participem de forma inovadora na GD, propiciando atitude pro-ativa no desenvolvimento dessa geração, 3- permitir que essas concessionárias possuam e operem sistemas de acumulação de energia e, finalmente, 4- preservar a qualidade, a modicidade do custo e a segurança do suprimento de energia elétrica do país.

Pietro Erber é engenheiro e diretor do Instituto Nacional de Eficiência Energética.
Emerson Tormann

Técnico Industrial em Elétrica e Eletrônica com especialização em Tecnologia da Informação e Comunicação. Editor chefe na Atualidade Política Comunicação e Marketing Digital Ltda. Jornalista e Diagramador - DRT 10580/DF. Sites: https://etormann.tk e https://atualidadepolitica.com.br

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