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Água e luz empurram famílias para o calote

Índice que mede a inadimplência cresce 5,45% em setembro. Pressionados pelo desemprego, pela inflação e pelos juris elevados, quase 40% da população - ou 57 milhões de pessoas - não têm como pagar as contas. Tarifaço do governo pesa muito.


A inflação próxima de 10%, os juros altos e o aumento do desemprego estão empurrando os consumidores para a inadimplência. Em setembro, o índice de calotes subiu 5,45% em relação ao mesmo período do ano passado, atingindo o maior nível desde janeiro de 2013 - quando a taxa ficou em 5,62% -, segundo divulgaram ontem o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e a Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL). Pelas estimativas das entidades, que levaram em consideração nomes registrados em cadastros de devedores de todo o país, 57 milhões de pessoas estavam sem condições de pagar as dívidas em dia no mês passado, o equivalente a 38,9% da população adulta do país.

A inadimplência atinge principalmente as contas de água e de luz. Em setembro, o número de dívidas em atraso subiu 12,55%, 6,22 pontos percentuais acima da média geral. No Centro-Oeste, os débitos não pagos nesse segmento cresceram 22,39%, o maior aumento entre as cinco regiões do país (veja arte). Em 12 meses, as tarifa de energia elétrica ficaram 52,79% mais caras, enquanto as taxas de água e esgoto avançaram 14,36%, de acordo com dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Deterioração

A queda da atividade econômica está destruindo a capacidade das famílias de honrar os compromissos e levando o calote a um patamar próximo ao do fim de 2012. Mas, diferentemente daquele período, em que as altas taxas de inadimplência decorriam do alto endividamento das famílias, o momento atual está sendo agravado pela deterioração do mercado de trabalho e pelo aumento do desemprego. "No caso das contas de água e luz, a causa não é apenas o encarecimento das tarifas. Sem emprego e com a renda em queda, os consumidores estão tendo mais dificuldades de honrar os compromissos", destacou a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti.

Diante do atual ambiente recessivo, a expectativa é de que a inadimplência siga ganhando força. As empresas continuarão demitindo e freando contratações. E, com a alta da inflação, em decorrência da pressão exercida por preços administrados e pelo aumento do dólar, a desaceleração das taxas de juros será mais lenta. Em relação a agosto, a quantidade de pessoas com dívidas em atraso no mês passado caiu 0,59%, queda puxada pelo recebimento do 13º salário pelos aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), além de feirões de negociações de dívidas. O resultado, no entanto, pouco muda o panorama.

"O aumento do desemprego e a redução da massa de rendimentos reduz a possibilidade de algumas famílias manterem as contas em dia. Em dezembro, em vez de observamos uma queda próxima de 1% em relação a novembro, como ocorreu no ano passado, poderemos ter um recuo menor", explicou Marcela, que garante: a luz no fim do túnel não está no começo de 2016. "Enquanto não tivermos uma solução para a crise política, o empresariado continuará sem confiança e reduzindo investimentos, o que produzirá uma recessão mais prolongada", acrescentou.

Com a baixa confiança dos consumidores, que estão menos propensos a comprar bens duráveis e atrelar mais dívidas ao orçamento, a queda no consumo prevista para 2015 e 2016 pode ser um fator determinante para impedir que mais pessoas fiquem com as contas em atraso. No entanto, para José Luís Oreiro, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a curto prazo, o cenário ainda é de aumento do calote. "A queda do consumo ajuda um pouco a reverter o aumento da inadimplência, mas não a ponto de contrabalancear o efeito da taxa de desemprego", afirmou.

Aceleração

Em setembro, o número médio de dívidas entre os inadimplentes ficou em 2,122. O resultado representou uma alta de 0,024 ponto percentual em relação ao registrado um ano antes. No mês passado, o número de débitos em atraso de até 90 dias subiu 12,10%, variação que só ficou abaixo do registrado entre as dívidas com três a cinco meses sem pagamento: 15,62%.

Cautela

Menos confiantes e endividados, os brasileiros estão colocando o pé no freio no consumo. Em setembro, o indicador de consultas para vendas a prazo do SPC Brasil e da CNDL recuou 6,87% em relação ao mesmo período do ano passado, a maior queda desde o início da série histórica, em 2013. As pessoas estão optando pelo pagamento à vista, o que também contribui para a desaceleração do indicador.

Inflação acelera

A valorização recente do dólar fez a inflação começar outubro com toda a força. Pressionado pela alta da moeda norte-americana, que impactou os custos das mercadorias no atacado, o Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M) saltou para 1,64% na primeira prévia do mês, informou ontem a Fundação Getulio Vargas (FGV), responsável pelo cálculo. No fim de setembro, o indicador mostrava alta de 0,95%.

O IGP-M é amplamente utilizado na correção de valores de contratos, como os de energia elétrica e de aluguel de imóveis. Apesar de elevado, o índice ainda não captou a alta do preço dos combustíveis, anunciada pela Petrobras na terça-feira da semana passada, já que a coleta de preços foi feita entre 21 e 30 de setembro. O impacto só deverá sentido a partir da segunda prévia do mês. A Agência Nacional de Petróleo (ANP) informou ontem que, desde o anúncio do reajuste, os consumidores já sofreram um aumento médio de 5,11% da gasolina nas bombas. O resultado mostra que os revendedores repassaram quase integralmente a alta de 6% decretada pela estatal.

A pesquisa da ANP constatou que o preço médio do litro da gasolina ao consumidor subiu de R$ 3,287, na semana de 27 de setembro a 3 de outubro, para R$ 3,455, entre 4 e 10 de outubro. Em algumas praças, como a de Brasília, o valor é ainda mais elevado. Foram consultados 3.277 postos em todo o país.

Na veia

O avanço da carestia ficou evidente, ainda, em outros dois indicadores recentes. Divulgado ontem, o Índice de Preços ao Consumidor - Semanal (IPC-S), também medido pela FGV, acelerou para 0,63% no período de 30 dias até a primeira semana de outubro, contra 0,42% na medição anterior. Houve aumento em seis das oito classes de produtos pesquisados. E, na quinta-feira, a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) informou que o custo de vida na cidade de São Paulo teve alta de 0,79% na primeira quadrissemana deste mês, depois de fechar setembro com variação de 0,66%.

No caso do IGP-M, o principal fator de pressão foi a alta do dólar. Entre os componentes do índice, o que mede a variação dos preços no atacado (IPA) subiu 2,36%. Somente os produtos agropecuários no IPA ficaram 3,42% mais caros. Os industriais avançaram 1,95%. "Direta ou indiretamente, todas as elevações estão relacionadas à taxa de câmbio. O efeito do dólar no IPA é na veia", disse a economista Basiliki Litvac, da MCM Consultores. A expectativa dela é de que o dólar caro continue pressionando a inflação ao produtor e apareça com mais evidência nos preços do varejo.


Emerson Tormann

Técnico Industrial em Elétrica e Eletrônica com especialização em Tecnologia da Informação e Comunicação. Editor chefe na Atualidade Política Comunicação e Marketing Digital Ltda. Jornalista e Diagramador - DRT 10580/DF. Sites: https://etormann.tk e https://atualidadepolitica.com.br

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